Causo I Nélson Vianna e seu Bebeto – aluno Deivid
Causo II Dr.Nélson Viana e seu Xará Nelson de Castro- Elaine
Causo III Leite dos Bois- Eva
Causo IV Luz elétrica e a Catedral Elisabeth
Causo V Férias na cidade natal- Fabrício
Causo VI O Cururu e o Curió- Gilcélio
Causo VII O meu casório- Deusdete
Causo VIII Minhas Paixões: Medicina e Política - Vanessa
Causo IX FADIR Faculdade de Direito - Andrea
Causo X FADIR Faculdade de Direito - Mais um causo - Rosilene
Causo XI Mário Ribeiro, o Marão - Andreony
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O Cururu e o Curió
Estou ouvindo bater de caixas nos escuros da rua de Baixo a casa de Maria Custodinha, o Zé é o marido dela. São os ensaios para as festas de agosto. Festa pra vivente nenhum botar defeito. Tudo para render graças a Nossa Senhora do Rosário, São Benedito e ao Divino Espírito Santo. O Zé organiza o terno de São Benedito, eles cantam:
Oi João, vamos apanhar limão.
Oi João, vamos apanhar limão.
Lá saiam o Zé da Custodinha, o Manuel Turíbulo, o João do Laranjão, o Zé Bonezão e o Curió, um barbeiro-cabeleireiro muito querido em nossa terra.
Não sei como o Curió arrumou este nome. Ele atendia homens, mulheres e crianças. Muito famoso na cidade. O salão ficava na rua Bocaiuva. Tinha bom movimento. A notícia correu: Curió criou uma loção para acabar com a calvície. Era o fim dos carecas na cidade, fazia nascer cabelo até em cabeças lisas iguais a ovo de galinha velha. “Mas o que é que o Curió bota nessa loção?”
“Não sei não, mas dizem que é babosa, misturada com mutamba, óleo de peixe e cheiro de manjericão.”
“Conversa fiada, peixe não tem cabelo.”
“Só se fosse óleo de bode, esse sim é cabeludo.”
O que sobrava da preparação da loção, Curió jogava no buraco do assoalho da sua casa velha. Trabalhava no escondido, não queria que soubessem de sua fórmula mágica.
Um dia, após uma chuva, todos ouviram uma algazarra de meninos na porta do salão de Curió. Todos foram ver o que era. Para surpresa de todos, lá estava um baita de um sapo cururu, com as costas cheias de cabelo, provavelmente resto do que Curió cortava e caía no assoalho. O cabeleireiro esperto logo gritou: “Viram como minha loção funciona!” Desse dia em diante a loção de Curió não dava pra quem queria.
O meu casório
O Ginásio Municipal ficava na avenida Coronel Prates, onde há pouco tempo ainda era a prefeitura. Me lembro dos alunos: Geraldo Borém, Darcy Ribeiro, Konstantin, Padre Murta. As moças estudavam no Colégio Imaculada, que ficava na mesma avenida. Nunca fui muito bem sucedido nos namoros, mas era comum que os rapazes do Ginásio namorassem as moças do Imaculada.
Naquela época, as terríveis dores de dente que sofri, quando menino, não me deixaram saudade. Parecia castigo. Ir ao dentista bom era coisa para as famílias mais favorecidas. Lembro do meu amigo Duzinho que foi a um dentista açougueiro. Quando deitou na cadeira foi surpreendido pelo botica forte, que o imobilizou e arrancou o dente, pena que o dente doente estava do outro lado. O dentista disse: “ Não faz mal, eu arranco o outro também e só cobro um.” Limpeza de dente se fazia com sabão de coco, cinza e folha de goiaba. Ninguém conhecia escova de dente. Banguelas e desdentados era comum. Todo mundo aceitava a feitura própria e dos outros. Não atrapalhava os namoros e os casamentos. Mas no meu caso atrapalhou. Quando rapaz, tive um dente que um dentista açougueiro quebrou, ficou só um pedaço. Um dia, meio dolorido com esse dente, fui ainda a uma festa. Tentei dar um beijo em uma prima. Assim na valentona. Ela não aceitou e no meio do pega-pega acabei esbarrando meu dente no dela. Perdi o beijo, a namorada e o dente. Fiquei tempo sem poder assobiar.
Tempos futuros, em 1946, já formado e voltei da capital, precisava fazer um pé de meia. Pensei comigo: “Preciso ficar solteiro uns cinco anos.” Mas o destino me reservou uma peça. Fui convidado para lecionar Física, Química e Biologia no Ginásio. Na secretaria, trabalhavam as filhas do diretor. Entre elas Milene Antonieta Coutinho, que era aluna da turma. Eu e meus amigos, recém-formados e chegados da capital seguíamos nas noitadas de farras. Ganhamos fama de perdidos. Milene, mostrando que tinha sangue dos Ribeiro, não me dava confiança.
No clube dos bancários, em cima da loja Jabur, houve uma festa primavera para eleição da rainha. Eu e primo dela Simeão Ribeiro trabalhamos, sem que ela soubesse, para ser eleita rainha. E assim aconteceu. Como prêmio de cabo eleitoral, ganhei a atenção dela. Tomei umas doses de uísques para criar coragem e no meio de uma dança disse: “Vou me casar com você.” Assim começou o namoro. Casamos em 1949, na rua Doutor Santos. Estamos juntos há 41 anos. Temos quatro filhas.: Mânia, Nair, Vitória e Liliane, nove netos e dois bisnetos. Da minha parte não restam dúvidas, começaria tudo de novo. Não estou tentando agradar, na minha casa, a última palavra quem diz sou eu: “Sim ,senhora.”
"Causos" de João Valle Maurício, (In: Janela do Sobrado), gentilmente enviados pela professora Vanessa.
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